Entenda as questões e a importância dessa discussão
Muito tem se falado sobre a certificação de produtos aqui no Brasil e logo surge o termo “Revogaço”. Mas você sabe o que isso significa? Ou até mesmo como ele afetaria os padrões nacionais de certificação praticados atualmente? Vamos entender.
A proposta que tem sido defendida pelo Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia) é seguir o padrão regulatório vigente nos Estados Unidos e na Comunidade Europeia. Esses países, ao contrário do que se pode interpretar com a palavra “revogaço”, não estão desregulamentados, nem tanto é permitida a venda desenfreada de produtos sem qualidade e que possam causar riscos à população.
Em matéria recente do veículo referência em assuntos econômicos, o Valor Econômico, a fala de Angela Flôres Furtado, atual presidente do Inmetro, indica que a maior pretensão é “simplificar até o fim de 2021 o emaranhado atual de 300 regulamentos vigentes relacionados à qualidade, à segurança e ao desempenho dos produtos comercializados no Brasil”.
É provável que você já tenha visto em algumas embalagens um símbolo pouco comum aqui, que traz as letras “CE”. Em tese, esse logo indica que o produto cumpre com rigorosos padrões normativos estabelecidos pela Comunidade Europeia e garante a ele a livre circulação na região. A existência dessa marcação pode ser considerada, para a maioria dos produtos, como uma autodeclaração ou autocertificação, uma vez que não há organismos responsáveis pela avaliação da conformidade desses itens. A responsabilidade, neste caso, recai sobre o próprio fabricante, ou importador, que deve assegurar que as diretrizes e requisitos obrigatórios ao escopo de cada artigo foram cumpridos. Em alguns casos, inclusive, há a necessidade da realização de ensaios, conduzidos por laboratórios acreditados pela UE (União Europeia).
Essa é a principal diferença entre o modelo aplicado atualmente pelo Inmetro e o modelo europeu. Enquanto na Europa o fabricante / importador tem essa responsabilidade, no Brasil, para um produto ser comercializado, ele deve passar por um processo de certificação, conduzido por um OCP (Organismos de Certificação de Produtos), para assim ser nacionalizado e vendido.
Dentro de um contexto sob as normativas do modelo europeu, os benefícios de grande destaque são a desburocratização da operação, bem como a desoneração do custo relacionado ao processo de certificação, refletindo em um cenário econômico de maior incentivo ao empreendedorismo, sob o ganho do surgimento de novos negócios, e por consequência, novos empregos. A diminuição dos custos necessários para a venda de produtos somada à necessidade da certificação também é uma injeção de ânimo para que os investidores aprimorem tecnologias e produtos, resultando em um maior crescimento dos negócios.
Avaliando inicialmente o cenário político econômico brasileiro, os grandes benefícios logo podem esbarrar em implicações determinantes para o alcance do efeito pretendido. Quando falamos de custos, eles terão que ser remanejados e empregados em pesquisas e serviços potentes de fiscalização, que devem contar com permanente supervisão, uma vez que os fabricantes tomarão as rédeas do processo de fiscalização de seus produtos. Outro fator relevante, que implica na efetivação desse novo modelo, é o sistema judiciário brasileiro, que se encontra sobrecarregado e, por isso, moroso. A preocupação advém da necessidade de, ao longo do processo, uma justiça branda ser aplicada e as falhas, que até agora puderam ser fácil e eficazmente corrigidas com o modelo vigente, poderem se tornar banais e recorrentes. Isso afetaria em cheio a imagem do país, propiciando o surgimento de um ambiente econômico duvidoso e de fragilidade em sua segurança, o que nos perpetuaria com uma imagem de alta vulnerabilidade perante os outros países, visão oposta a que temos atualmente.
Com essa discussão pode-se concluir que
há a probabilidade de altos investimentos processuais se tornarem necessários, a fim de alcançar melhorias do processo produtivo e da capacidade de avaliação da qualidade e segurança dos produtos, talvez até qualificação e reeducação dos fabricantes. Uma reciclagem de hábitos dos envolvidos e precisão nas informações e conhecimentos deve ser prioridade antes que se cogite de tornar esse modelo participante de nosso sistema de garantia da qualidade do produto ao consumidor.
Técnico de Certificação